sexta-feira, 4 de março de 2011

Há esperança

PARTE I - Noite Fria


           Carlos acelerara seus passos, queria sair o quanto antes daquela noite fria e chegar ao aconchego de seu lar.
            Calças e sapatos já surrados de tanto o acompanharem em sua busca por um emprego que já durava mais de um mês. Seu casaco marrom já desbotado era a melhor blusa que tinha.
            Por uma viela que usava de atalho, caminhava apressadamente sem olhar para nada, seus pensamentos se perdiam no convite que recebera.
            Um amigo seu trabalhava na empresa que Carlos sempre quisera trabalhar. Naquela tarde, seu amigo ligara convidando-o para um jantar da empresa. Lá estariam chefes, supervisores, funcionários e convidados. Seu amigo fazia questão de apresentar Carlos para o chefe. Seria inegavelmente a melhor oportunidade de sua vida!
            Carlos aceitara o convite (óbvio), mas algo martelava em sua mente: o jantar seria no sábado a noite em uma fazenda na cidade vizinha, onde o frio era mais cortante ainda. O que Carlos vestiria? Os sapatos e o casaco marrom que mais pareciam ter sido herdados de seu avô? E a calça.... Bom a calça ele tinha uma nova que guardava para ocasiões especiais e esta com certeza seria uma.
            Estava tão absorto em seu devaneio que nem percebeu o que prendera sua perna esquerda. Ao olhar para baixo (para sua surpresa) viu que uma mão lhe segurava o calcanhar. Um homem já de certa idade, descalço e sem camisa, levemente ferido estava deitado no chão. Então o senhor lhe implorou que emprestasse o celular, alegando que havia sido assaltado e que precisava fazer uma ligação.
            “Com certeza está bêbado” Carlos pensou, pois mal conseguia entender o que o homem falava. Não acreditou muito na história do assalto e espancamento, mas teve uma imensa vontade de emprestar-lhe o celular. Titubeou, pois seu saldo já era baixo e não teria condições de reabastecê-lo tão cedo. Olhou para os olhos daquele senhor pronto para lhe dizer não e continuar sua caminhada para a casa (que já estava tão próxima), mas ao ver uma lágrima escorrer por aquele rosto ferido não conteve o impulso de seu coração. Pegou aquele pobre homem pelos braços, o colocou de pé e entregou o celular em sua mão. Com muito esforço para conter a tremedeira (de frio e dor) o ele discou um número longo e pôs o telefone ao ouvido.
            Carlos não conseguiu entender a conversa direito, por alguns instante até pensou tratar-se de uma língua estrangeira, mas logo imaginou que poderia ser embriaguez mesmo. O senhor foi breve ao telefone e agradeceu muito a Carlos, perguntou seu sobrenome e sem pensar muito nas conseqüências Carlos respondeu, então assegurou que Carlos poderia ir embora pois já estavam a caminho para buscá-lo. “Eu irei recompensá-lo” afirmou com veemência o senhor; Carlos sorriu (completamente descrente) e já estava saindo quando mais uma vez foi tomado por um impulso de seu coração. Deixaria um senhor de idade machucado parcialmente despido com frio numa noite de inverno? Deu meia volta tirou seu casaco e entregou (com um aperto no coração) ao homem, que aceitou sem muito hesitar. Tirou também os sapatos e os entregou, o senhor não quis aceitar, mas Carlos insistiu e disse que morava ali perto não teria problema ir descalço. Então ele aceitou e disse: “Ainda hoje pensei que esta nação merecia ser ignorada pela violência que a move, mas agora penso que todo lugar que houver pessoas como você merece crédito e apoio”. Carlos sorriu indiferente novamente e foi para casa sem nem sequer refletir muito acerca do que ouvira.


Leia a parte II: http://aprendizdetrovador.blogspot.com/2011/03/ha-esperanca_14.html

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